Meu nome é Carlos Augusto Pintor de Arruda (CRM-SP 199.991), sou Ginecologista e Obstetra (RQE 101.557), especialista em endoscopia ginecológica, com foco no tratamento de endometriose e cirurgia minimamente invasiva. Sou membro da equipe de Algia Pélvica e Endometriose da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP) e da Sociedade Brasileira de Endometriose (SBE). Trabalho diariamente para melhorar a qualidade de vida de minhas pacientes, pois acredito que a mulher não precisa se conformar com dores ou limitações que são erroneamente consideradas “normais”. Hoje, quero conversar com você sobre endometriose, uma condição que afeta milhões de mulheres, mas ainda é cercada de dúvidas e desinformação.
O que é endometriose?
A endometriose é uma doença caracterizada pela presença de tecido semelhante ao endométrio (camada que reveste o interior do útero) fora da cavidade uterina, podendo afetar órgãos como ovários, trompas, intestino e bexiga. É importante entender que ter endometriose não é “normal” e requer avaliação adequada.
A Endometriose afeta 10% das mulheres em idade reprodutiva, com quadros que vão desde pequenas lesões localizadas próximas ao útero, até lesões profundas afetando outros órgãos, o que pode não apenas causar dor e perda da qualidade de vida, até mesmo, colocar até a vida dessas pacientes em risco.
Muitas das minhas pacientes chegam ao consultório relatando cólicas incapacitantes, desconforto durante as relações sexuais e um cansaço constante que interfere até mesmo em suas atividades diárias. Nesses casos, podemos estar diante da endometriose. Por isso, o acompanhamento regular com um ginecologista faz toda a diferença para um diagnóstico precoce e tratamento eficaz.
Principais sintomas da endometriose
Os sintomas podem variar de intensidade e, às vezes, podem até ser silenciosos. Porém, alguns sinais são mais frequentes:
- Dor pélvica crônica: Cólicas menstruais intensas (dismenorreia) e constantes ou dor que pode surgir em qualquer fase do ciclo.
- Dor durante as relações sexuais (dispareunia): A presença de tecido endometrial em regiões como o fundo de saco vaginal ou ligamentos pélvicos pode causar dor profunda durante o ato sexual. Essa dor, inicia principalmente quando o membro masculino toca no fundo da vaginal e muitas vezes é amenizada quando a mulher troca de posição durante o ato sexual, mas com o tempo ela pode evoluir e o ato deixa de ser prazeiroso e passa a significar apenas dor.
- Sangramento anormal: Algumas pacientes podem apresentar sangramentos fora do período menstrual ou menstruações muito intensas, mas isso é mais comum quando a Endometriose está associada a outra doença, a Adenomiose, tema de outro artigo.
- Dificuldade para engravidar: A endometriose é uma das principais causas de infertilidade feminina, pois pode interferir no funcionamento adequado das trompas e ovários. Mas atenção! Endometriose não é sinônimo de infertilidade! Apenas 40% das mulheres com endometriose irão enfrentar esse problema ao longo da vida.
- Fadiga ou cansaço: A inflamação crônica gerada pela doença pode trazer um estado constante de exaustão física e mental.
Muitas mulheres que me procuram acham que as cólicas severas são parte “natural” da vida. Mas se você sente dores que te impedem de realizar suas atividades diárias, isso é um sinal de alerta. Sentir dor não é normal!
Diagnóstico da endometriose
Em primeiro lugar, lembre-se: O DIANGÓSTICO DA ENDOMETRIOSE É CLÍNICO! Ou seja, se seu exame e imagem não detectou a doença, ainda assim ela pode estar presente. Isso ocorre porque os exames de imagem somente são capazes de detectar a doença mais profunda, que já invadiu mais de 5 mm dos tecidos da pelve. Contudo, a doença superficial (peritonial) pode estar presente.
O diagnóstico adequado é feito por meio de uma investigação clínica detalhada e auxiliado por exames de imagem. A ultrassonografia com preparo intestinal especializada em mapeamento de endometriose é uma das ferramentas iniciais que utilizamos, pois pode detectar lesões profundas, cistos endometrióticos (endometriomas) e aderências.
Em alguns casos, a ressonância magnética oferece uma melhor definição das lesões, sendo fundamental no planejamento cirúrgico.
Contudo, lembre-se que esses exames devem ser feitos por profissionais com vasta experiência em endometriose. Por isso, muitas vezes irei indicar locais e confiança para que você possa realizar seus exames com segurança.
Tratamento clínico da endometriose
São raros os casos em que uma paciente chega no meu consultório e é indicado a cirurgia logo nas primeiras consultas. Existem critérios bem específicos e estabelecidos para isso. O tratamento da endometriose depende do grau de acometimento, sintomas e desejos reprodutivos da paciente.
O tratamento da Endometriose deve sempre começar pelo tratamento clínico, ou seja, com uso de medicamentos e com mudanças no estilo de vida dessa mulher.
E lembre-se: não existe medicamento que leve a cura da endometriose! A endometriose é uma doença sistêmica que mesmo após a retirada cirúrgica dos focos, pode retornar. Por isso, o medicamentos e tratamento clínico tem por objetivo a melhora da qualidade de vida da paciente. Ou seja, recuperar a felicidade e uma vida sem dor!
Medicamentos hormonais
São o padrão ouro, ou seja, o principal medicamento para tratamento da Endometriose, que podem ou não serem associados a outros medicamentos, mudanças nos hábitos de vida e nutracêuticos. Esses medicamentos ajudam a controlar o sangramento e a dor.
Outro ponto importante é que nenhum medicamento hormonal demonstrou ser superior a outro, contudo a experiência nos mostra que muitas vezes, um medicamento pode funcionar melhor pra uma paciente do que para outra, por isso é tão importante o trabalho personalizado e individual com cada paciente.
Os principais medicamentos hormonais são:
- Pílulas anticoncepcionais combinadas (que contém estrogênio e progestagênio)
- Pílulas exclusivas à base de progestagênio
- Injeções mensais, anéis vaginais e adesivos
- DIUs hormonais
- Implantes subdérmicos
Atenção: o uso do DIU de cobre ou prata é contraindicado em pacientes com Endometriose.
Todos os medicamentos hormonais devem ser usados de forma contínua, ou seja, de forma a impedir a menstruação de acontecer.
Anti-inflamatórios e analgésicos
Devem ser usados com cautela, somente para casos de dor esporádica. Se o uso desses medicamentos está sendo constante, devemos repensar o restante do tratamento.
Nutracêuticos, Unha de gato e Canabidiol
Produtos como ácidos graxos ômega-3, vitaminas e antioxidantes têm sido cada vez mais estudados por seus efeitos anti-inflamatórios. Gosto de associar nutracêuticos em muitos casos para complementar o tratamento hormonal.
A Unha de gato (Uncaria tomentosa) é uma planta com propriedades anti-inflamatórias e imunomoduladoras. Embora seja um recurso complementar, muitas pacientes relatam melhora da dor pélvica quando associada a outros tratamentos. Contudo, apesar do chá de Unha de gato ser muito comum, a concentração do principio ativo no chá é muito baixa. A forma ideal é o uso em capsulas manipuladas.
Já o Canabidiol (CBD) tem ganhado espaço no tratamento da Endometriose. Estudos recentes apontam que o canabidiol pode ter papel importante no manejo da dor crônica e na redução do processo inflamatório. O uso medicinal de canabidiol, quando bem indicado e prescrito de forma segura, pode contribuir para o alívio dos sintomas de maneira significativa.
É importante ressaltar que cada organismo responde de forma diferente. Por isso, sempre individualizo o tratamento com base na história clínica de cada mulher.
Mudanças no estilo de vida, fisioterapia pélvica e psicoterapia
A endometriose está diretamente ligada a processos inflamatórios e ao estado geral do organismo. Por isso, além da medicação, mudanças no estilo de vida fazem uma enorme diferença no tratamento.
- Alimentação balanceada e dietas anti-inflamatórias: Dietas ricas em frutas, legumes, peixes e oleaginosas são recomendadas para reduzir o processo inflamatório. Evitar alimentos industrializados, com corantes e conservantes pode trazer benefícios palpáveis. Entre as dietas estudadas, a Dieta Mediterrânea ou FOD-MAPS têm mostrado grande resultado na melhora da qualidade de vida das mulheres, com diminuição de consumo de carne vermelha e maior ingesta de hortaliças, azeites extra-virgem e castanhas. O acompanhamento conjunto com uma nutricionista especializada é essencial.
- Prática de exercícios físicos: A atividade física regular ajuda no controle da dor, melhora a circulação sanguínea e reduz o estresse. Caminhadas, pilates e ioga são excelentes opções.
- Meditação e controle do estresse: Mulheres que possuem essas práticas incorporadas ao seu dia-a-dia demonstram melhor resposta ao tratamento e menos dor.
Quero também dar um destaque especial a dois pontos:
- Fisioterapia pélvica: Muitos quadros de dor são exacerbados por tensão muscular na região pélvica. Quando chegamos nesse ponto, surgem focos de dor que não estão ligados aos focos de endometriose, mas gatilhos de dor de origem muscular, dado a tensão que essa mulher vive. A fisioterapia contribui para o relaxamento dos músculos do assoalho pélvico, alívio da dor durante as relações sexuais e melhora a qualidade de vida.
- Psicoterapia: Lidar com a dor crônica gera impactos emocionais profundos. A psicoterapia ajuda a desenvolver estratégias de enfrentamento do estresse, ansiedade e depressão que podem acompanhar a endometriose. A mulher com Endometriose enfrenta muitos desafios ao longo do seu dia-a-dia. Em muitos casos, a dor tende a piorar quando não cuidamos da saúde mental.
Tratamento com implantes hormonais (gestrinona)
Os implantes hormonais são inseridos sob a pele que liberam hormônios de forma contínua. Uma das substâncias utilizadas no controle da endometriose é a gestrinona, que pode ajudar na redução dos focos endometrióticos e alívio da dor.
Muitas pessoas chamam esse implante de “chip da beleza”, porém esse termo não é adequado, pois transmite a impressão de que se trata apenas de um recurso estético. Na verdade, a gestrinona é um hormônio com potencial terapêutico importante para o controle da endometriose, além de outras indicações. Como todo tratamento, deve ser bem indicado, cuidadosamente avaliado e acompanhado por um médico especialista.
- Vantagens: O hormônio é liberado de forma contínua, evitando oscilações que podem piorar a dor. Além disso, sua absorção não sofre interferência de medicações orais ou distúrbios gastrointestinais.
- Desvantagens: Podem ocorrer efeitos colaterais, como mudanças na oleosidade da pele e alterações do humor. É crucial discutir os prós e contras com seu ginecologista.
O implante hormonal com gestrinona é uma opção valiosa para algumas pacientes, mas ainda carece de estudos. Não é a primeira opção no tratamento, mas devemos considerar essa opção antes de indicar uma cirurgia, os resultados que temos obtido com as pacientes é muito promissor. Mas, cada caso deve ser avaliado de forma individual, levando em conta histórico médico, desejo de engravidar e resposta a outros tratamentos.
No consultório, eu utilizo os implantes da Biòs, que são totalmente absorvidos pelo organismo e sem a necessidade de após o término do tratamento ter que ficar retirando aqueles tubinhos indesejados. Vale a pena conversar sobre essa possibilidade antes e partir pra cirurgia.
Cirurgia minimamente invasiva: laparoscopia ou robótica
Na Endometriose não existe espaço para a cirurgia convencional (aberta), a cirurgia deve ser sempre a minimamente invasiva, pois permite enxergar melhor os focos da doença.
Exceto em casos específicos que a cirurgia deve ser a primeira opção – como quando a doença leva ao risco de colocar a saúde da paciente em risco – essa deve ser indicada somente se houve falha no tratamento clínico ou se o objetivo da paciente for engravidar.
A laparoscopia, assim como a cirurgia robótica, permite a visualização direta das lesões, garantindo maior precisão na remoção dos focos de endometriose.
- Visualização detalhada: Com câmeras de alta definição, o cirurgião enxerga lesões pequenas e profundas que podem passar despercebidas em técnicas convencionais.
- Menor dor pós-operatória: A incisão é menor, o que reduz o trauma cirúrgico e acelera a recuperação.
- Retorno mais rápido às atividades: Muitas pacientes voltam à rotina normal em pouco tempo, comparado à cirurgia aberta.
- Preservação da fertilidade: Quando bem planejada, a cirurgia retira os focos de endometriose, reduzindo o risco de complicações e preservando a função dos ovários, principalmente nas pacientes que querem engravidar.
Em minha prática, é muito gratificante ver como a laparoscopia ou cirurgia robótica, aliada a um bom planejamento clínico, pode mudar de forma tão positiva a vida das mulheres que sofrem com endometriose. Quando bem indicada, a cirurgia muda a vida da mulher com endometriose!
Qual a melhor abordagem para você?
Não existe “receita de bolo” quando falamos de endometriose. Enquanto para algumas pacientes o tratamento clínico e as mudanças de estilo de vida são suficientes, outras podem necessitar de uma abordagem cirúrgica. A melhor estratégia é aquela que leva em consideração todos os aspectos da sua saúde: físico, emocional e reprodutivo.
A mensagem que sempre passo às minhas pacientes é que o acompanhamento regular permite ajustar o tratamento conforme necessário. Afinal, a endometriose é uma condição crônica, que pode flutuar ao longo do tempo e exigir cuidados constantes.
Cuide da sua saúde e não normalize a dor! A endometriose não deve ser encarada como um “destino inevitável” ou algo “normal” para a mulher. Precisamos desmistificar a ideia que sua avó lhe ensinou que toda mulher sente dor! Isso só atrasa o diagnóstico e o tratamento.
Com avaliação correta, uma estratégia de tratamento bem definida e um acompanhamento contínuo, é possível viver sem dor e com qualidade de vida. Existem diversas ferramentas e abordagens terapêuticas disponíveis — desde ajustes na alimentação, fisioterapia pélvica, psicoterapia e nutracêuticos até medicamentos, implantes hormonais e cirurgia minimamente invasiva.
A chave para o sucesso no tratamento é individualização e constância no acompanhamento. Quanto antes você buscar ajuda especializada, mais cedo encontrará o melhor caminho para o seu caso.
Se você se identifica com os sintomas descritos ou tem suspeita de endometriose, estou aqui para te ajudar. Clique no botão abaixo e agende sua consulta. Vamos juntos encontrar o tratamento mais adequado para você!